
O sistema de pagamentos instantâneos brasileiro, o PIX, entrou no radar dos Estados Unidos após o ex-presidente Donald Trump solicitar, em 15 de julho, a abertura de uma investigação comercial contra o Brasil. Embora o PIX não tenha sido citado diretamente no documento oficial, foram mencionados “serviços de comércio digital e pagamento eletrônico” oferecidos pelo Estado brasileiro — e o PIX é o principal deles.
Segundo especialistas, a ofensiva dos EUA reflete preocupações comerciais e geopolíticas, incluindo a concorrência com bandeiras de cartões de crédito americanas (como Visa e Mastercard), o embate com big techs, o avanço do PIX Internacional e as discussões do Brics sobre alternativas ao dólar.
Concorrência com empresas americanas
Gratuito para pessoas físicas e com baixo custo para empresas, o PIX representa uma ameaça comercial às operadoras de cartão de crédito dos EUA. Jorge Ferreira dos Santos Filho, professor da ESPM, afirma que as regras brasileiras obrigam fintechs estrangeiras a se adaptar, reduzindo margens de lucro. Até big techs como Google são impactadas.
Apesar disso, especialistas como Ralf Germer (PagBrasil) defendem que o PIX não foi criado para substituir cartões de crédito, e que há espaço para coexistência. Desde seu lançamento, o uso de cartões no Brasil continuou a crescer.
PIX Internacional, Brics e ameaça ao dólar
O Banco Central trabalha para expandir o uso do PIX fora do Brasil, em países como Argentina, EUA e Portugal. O objetivo é permitir pagamentos transfronteiriços integrados. Especialistas afirmam que esse avanço, aliado à proposta do Brics de criar uma moeda comum, ameaça a hegemonia do dólar. Fabrizio Velloni, da Frente Corretora, destaca que os EUA veem com desconfiança qualquer estrutura que reduza sua influência monetária.
Além disso, o PIX poderia concorrer com o sistema internacional SWIFT, hoje central para transações financeiras globais e sanções econômicas lideradas pelos EUA.
PIX como vitrine e modelo global
O sucesso do PIX virou referência global. Pedro Henrique Ramos, do RegLab, afirma que o sistema se tornou símbolo de inovação estatal eficiente, com mais de R$ 26,4 trilhões movimentados em 2024. Diversos países estudam seu modelo, o que eleva o protagonismo do Brasil na definição de padrões globais em pagamentos digitais.
Pressões comerciais e histórico de ofensivas dos EUA
Os EUA já questionaram iniciativas semelhantes em países como Indonésia, Índia e China, alegando práticas desleais que prejudicam empresas americanas. Ramos ressalta que infraestruturas públicas de pagamento são ferramentas de inclusão social e soberania digital, o que entra em choque com os interesses comerciais dos EUA.
Nos EUA, sistemas como Zelle e FedNow não atingiram a mesma popularidade do PIX. O FedNow, por exemplo, teve adesão opcional e pouca participação dos grandes bancos americanos.
Big techs e entraves regulatórios
O embate também envolve gigantes como Google e Meta, que veem no PIX um concorrente direto aos seus próprios sistemas de pagamento. Especialistas apontam que as tensões entre essas empresas e decisões do STF, como a responsabilização das plataformas por conteúdos publicados, também influenciam o contexto político da investigação.
Outro episódio relevante foi a suspensão, em 2020, da função de pagamentos via WhatsApp pelo Banco Central e pelo Cade, por riscos à concorrência e ao funcionamento do sistema financeiro. Mesmo com autorização parcial em 2023, a Meta encerrou a função de pagamento entre pessoas via cartão de débito, priorizando o PIX.

FONTE G1